quinta-feira, 17 de março de 2016

Mia Couto é demasiado parcial





O escritor moçambicano Mia Couto deveria evitar fazer considerações políticas , para que possa continuar a merecer a consideração e respeito de todo o publico nacional, para que seja uma figura consensual, aceite por todos por não se deixar confundir com nenhuma das partes em disputa política. Porém, tem sido recorrente Mia Couto posicionar-se do lado do partido Frelimo e do seu governo. Nos seus pronunciamentos públicos, Mia Couto não consegue manter-se neutro, sempre procura colocar-se do lado do Frelimo e isso não faz bem para uma figura do tamanho dele que construiu a sua fama com esforço e sabedoria próprios.
Numa agressão externa, seria uma obrigação moral de todos se colocarem do lado do governo para defendermos a pátria ameaçada e quem assim não o fizer, pode correr o risco de ser rotulado de traidor, mas te não é o caso em apreço. Trata-se de uma luta entre irmãos desavindos por razões sobejamente conhecidas – a exclusão de uns pelos outros, da discriminação, em todos os sentidos, quer político, econômico e social, de um grupo pelos outros, e da ganância pelo poder absoluto, não se importando como chegar a ele.
O grupo a que Mia Couto sai em defesa instrumentaliza as instituições públicas, a polícia e o sistema judicial para garantir a manutenção e reprodução do poder. Os órgãos eleitorais, desde o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral, Comissão Nacional de Eleiões passando perlo Conselho Constitucional – estão, escrupulosamente, desenhados para garantir a vitória de uns e a derrota, inevitavelmente, de outros, independentemente do sentido da votação. Esta é a razão fundamental do conflito tanto ontem quanto hoje. Outra análise é de muito sérias dúvidas.
Assim, as eleições servem apenas para impressionar ao mundo ocidental que “nós também brincamos às eleições” para o país continuar a receber apoios económico-financeiros e fazer prosperar uma classe empresarial ou, supostamente, empresarial à custa de roubo e gatunagem, depois de um piscar de olho das organizações internacionais como a União Europeia que, de forma reiterada, abençoam a burla eleitoral, transmitindo a mensagem de que há uma democracia para o mundo civilizado e outra para os indígenas africanos. O que eles abençoam como bom para nós, na terra deles nem para a latrina vai porque os seus povos abominam roubos.
Desta vez, Mia Couto diz que a Renamo e Afonso Dhlakama ao colocarem pré-condições para se iniciar o diálogo com o governo e Presidente da República demonstra que não deseja conversar. Pensar de tal modo é uma grande falácia quem ainda se lembra de como o governo quebrou a pouca confiança com a Renamo que ainda prevalecia. Depois de mais de uma centenas de rondas infrutíferas entre as delegações do governo e da Renamo, de duas emboscadas e um cerco à casa do líder da Renamo, numa tentativa de o eliminar, fisicamente, à maneira angolana, seria ingénuo demais que a Renamo aceitasse tudo sem a presence de uma mediação comprovadamente séria e comprometida. 
O que mudou de substancial do lado do governo capaz de alterar a opinião da Renamo e do publico em geral? Eu, pessoalmente,”desconsigo” vislumbrar. Vejo o mesmo governo agindo atrás das mesmas intenções – excluir o diferente. A recente revelação da existência de esquadrões de morte para matar os adversários da Frelimo só pode ser concebido por gente horrível e sem moral. Nem mesmo o sistema colonial havia instituído, em Moçambique, grupos armados para eliminar, pelas cidades, povoados e aldeias, os potenciais adversários do regime como acontece nos nossos tempos de hoje. O colono era mau, na verdade, mas, esses são piores, de facto.
Depois duas emboscadas das forças governamentais, é exigir demais que Dhlakama vá ao encontro dos seus carrascos como se fosse à praia ou a uma barraca tomar uma cerveja gelada e saboreando tremoços. É um exagero intragável. Mia Couto deveria ser mais equilibrado, equidistante das disputas políticas para continuar a ser o patrimônio de todos os moçambicanos, pois, ele é uma referência obrigatória da literatura moçambicana moderna e eu costume ler os livros de Mia Couto com muito prazer. Se continuar a acenar a partir da janela da Frelimo, poderá ser detestado por muitos dos seus leitores de hoje.
O tamanho que Mia Couto ostenta hoje custou muito sacrifício a construí-lo e não deve dar ao luxo de derrubar este edifício cultural de maneira leviana para agradar a um grupo de pessoas que se mantém no poder através de truques e malabarismos. Mia Couto é um grande escritor que extravasa as fronteiras nacionais, por isso, deveria ser mais cauteloso para se deixar enlamar de qualquer maneira em questões políticas polêmicas, a menos que tire algum proveito disso.
Politicamente, pouco se poderia esperar do posicionamento de Mia Couto porque, em 1974 e nos anos subsequentes à Independência Nacional, ele fez parte do grupo que combatia o multipartidarismo, por emoção do momento ou convicção própria. Muitos que assim procederam, com o tempo foram mudando e, hoje, tomam outros posicionamentos públicos. Mudar porque as circunstâncias mudaram, é sempre bom e uma atitude de louvar. Até Judas Iscariotes mudou de opinião, por isso, se foi enforcar quando, pouco depois, se apercebeu o sua atitude de se deixar vender por 30 moedas levaria Jesus Cristo, o seu Mestre, à morte certa.
Mia Couto, que hoje recrimina Dhlakama, não condenou através da sua voz nem através da sua principal arma – a pena – as emboscadas que as forças governamentais o submeteram. O perigo cerco à sua residência, na Beira, não mereceu uma palavra de repreensão ao partido Frelimo e ao seu governo, mas, não hesitou em dizer que a Renamo e Dhlakama não querem paz. Mia Couto não viu nenhuma gravidade nas atrocidades a que as populações de Moatize e Tsangano estão sujeitas pelas forças governamentais que as obrigam a procurar refúgio e sossego no Malawi.     
De forma nenhuma eu pretendo cercear a liberdade de opinião de Mia Couto, como alguém pode pensar, mas entendo que a opinião emitida por Mia Couto já foi formulada por muitos outros mas nunca teve o impacto como foi da vez do nosso escritor. Os demais podem repetir isso mil vezes ao dia e ninguém ouvir nada porque a voz deles não chega aos céus. A diferença reside, exactamente, aí: Mia Couto é uma grande figura social, não deve participar da divisão do povo. Mia Couto não é uma figura qualquer. Basta uma palavra sua para inundar o mundo, por isso, livrar-se de gente procurada pelo Tribunal Penal Internacional, acusada de violação dos direitos humanos seria um passo importante passo.                    

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